<bibliografia>
Guia, p. 396: STF Inq. 4.831 (Min. Celso de Mello): “Assinale-se, bem por isso, no que se refere à descoberta fortuita ou acidental de elementos de informação obtidos, casualmente, contra alguém até então desconhecido, por meio de obtenção de prova efetuada em face de terceiras pessoas, em procedimento probatório validamente instaurado quanto a tais terceiras pessoas (Presidente Bolsonaro e Sérgio Fernando Moro), que a prova penal daí resultante reveste-se de plena eficácia jurídica. Destaque-se, bem por isso, que o tema da descoberta fortuita ou acidental tem constituído objeto de ampla discussão doutrinária, com especial destaque para aqueles autores que reconhecem a legitimidade dos dados informativos casualmente obtidos em face de pessoas estranhas ao procedimento investigatório, tal como sucede na espécie, assumindo, em consequência, plena validade jurídica e conferindo, desse modo, inteira licitude aos elementos de informação assim descobertos”.
Guia, p. 396: TREVISAN, Flavia Cristina. […] “A partir da definição de meios de obtenção de prova, é possível identificá-los como instrumentos que geram restrições a direitos fundamentais pessoais consagrados constitucionalmente, avançando sobre a reserva da intimidade e da vida privada. Aí se enquadram, por exemplo, as medidas de busca e apreensão e a interceptação das comunicações telefônicas”.
Guia, p. 396: NICOLITT, André. Lei n. 12.403/2011. O Novo Processo Penal Cautelar. A prisão e as demais medidas cautelares. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 112: “O mandado de busca e apreensão deve conter os motivos e a finalidade da diligência. Pensemos na hipótese de no curso da busca ocorrer o encontro de documentos ou objetos que dizem respeito não ao crime ou crimes que motivaram e deram contorno à finalidade da busca e apreensão e sim a crime ou crimes diversos e não relacionados ao objeto da investigação ou instrução. A isto se dá o nome de ‘encontros fortuitos’”.
Guia, p. 396: TREVISAN, Flavia Cristina. […] “[…] os conhecimentos que não apresentem identidade investigatória com o crime legitimador da medida restritiva hão de ser tidos como fortuitos, aos quais se atribui apenas uma relevância investigatória, servindo como mera notícia de crime conformadora de indício para o início de nova investigação, no âmbito da qual novas medidas restritivas eventualmente poderão ser autorizadas, dentro dos limites legais, sempre com exigência de prévia autorização judicial motivada, pautada pelo princípio da proporcionalidade”.
Guia, p. 396-397: Duvidosa a invocação da “Teoria dos campos abertos” (plain view doctrine), conforme GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. Nulidades no Processo Penal: Introdução principiológica à teoria do ato processual irregular. Salvador: JusPodivm, 2015, p. 501-503: “Em suma, a limitação da teoria dos campos abertos trata basicamente da possibilidade de o agente apreender elementos de convicção que se encontram em poder do investigado quando tais coisas se encontram à vista do agente policial que realiza a diligência. Desta forma, a omissão do mandado de busca e apreensão quanto ao objeto da busca encontrado à vista pelo agente policial é suplantada por esta limitação, que trata de validar a apreensão do objeto pela autoridade. O leading case nesta limitação é o caso US vs Carty, em que houve a apreensão de arma de fogo equipada com silenciador encontrada no domicílio do acusado, muito embora o mandado não fizesse menção à ela. Pela aplicação da doutrina dos campos abertos, esta omissão do mandado foi suprida pelo objeto apreendido se encontrar à mostra da autoridade, sendo, portanto, considerada legítima. Algumas exceções são colocadas quanto à aplicação da doutrina dos campos abertos. A primeira delas reside na circunstância de não se aplica a plain view doctrine quando o agente policial já executou o objeto do mandado e a prova surge após a consumação daquele objeto. Num segundo momento, torna-se objetável a referida limitação no momento em que o agente policial revista lugares nos quais o objeto do mandado jamais poderia se encontrar”.
Guia, p. 397: STF, HC 95.009 (Min. Eros Grau): “De que vale declarar, a Constituição, que a ‘casa é o asilo inviolável do indivíduo (art. 5º, XI) se moradias são invadidas por policiais munidos de mandados que consubstanciem verdadeiras cartas brancas, mandados com poderes de a tudo devassar, só porque o habitante é suspeito de um crime? Mandados expedidos sem justa causa, isto é, sem especificar o que se deve buscar e sem que a decisão que determina sua expedição seja precedida de perquirição quanto à possibilidade de adoção de meio menos gravoso para chegar-se ao mesmo fim. A polícia é autorizada, largamente, a apreender tudo quanto possa vir a consubstanciar prova de qualquer crime, objeto ou não da investigação. Eis aí o que se pode chamar de autêntica ‘devassa’. Esses mandados ordinariamente autorizam a apreensão de computadores, nos quais fica indelevelmente gravado tudo quanto respeite à intimidade das pessoas e possa vir a ser, quando e se oportuno, no futuro usado contra quem se pretende atingir. De que vale a Constituição dizer que ‘é inviolável o sigilo de correspondência’ (art. 5º, XII) se ela, mesmo eliminada ou ‘deletada’, é neles encontrada? E a apreensão de toda a sorte de coisas, o que eventualmente privará a família do acusado da posse de bens que poderiam ser convertidos em recursos financeiros com os quais seriam eventualmente enfrentados os tempos amargos que seguem a sua prisão. A garantia constitucional da pessoalidade da pena (art. 5º, XLV) para nada vale quando esses excessos tornam-se rotineiros”.
Guia, p. 397: GOMES, Luiz Flávio. Natureza jurídica da Serendipidade nas interceptações telefônicas.: “Essa estranha palavra (como nos informa Ethevaldo Siqueira – O Estado de São Paulo de 15.02.09, p. B10) significa ‘algo como sair em busca de uma coisa e descobrir outras), às vezes até mais interessante e valiosa. Vem do inglês serendipity (de acordo com o Dicionário Houaiss), onde tem o sentido de descobrir coisas por acaso. Serendip era o antigo nome da ilha do Ceilão (atual Sri Lanka). A palavra foi cunha em 1754 pelo escritor inglês Horace Walpole, no conto de fadas ‘Os três príncipes de Serendip’ que sempre faziam descobertas de coisas que não procuravam”.
Guia, p. 398: STF, AGRAI 626.214 (Min. Joaquim Barbosa): “O Supremo Tribunal Federal, como intérprete maior da Constituição da República, considerou compatível com o art. 5º, XII e LVI, o uso de prova obtida fortuitamente através de interceptação telefônica licitamente conduzida, ainda que o crime descoberto, conexo ao que foi objeto da interceptação, seja punido com detenção”.
Guia, p. 398: GALLINA, Matheus do Valle. O valor probatório da prova obtida por meio do encontro fortuito no Processo Penal. Florianópolis: UFSC (Monografia – Direito), 2013, p. 82: “Não é possível remeter o conteúdo das conversações interceptadas ao organismo administrativo (Federação Espanhola de Futebol) porque as conversações detectadas não estão amparadas pela autorização judicial que permitiu as escutas que foram gravadas. Essas conversações nem sequer deveriam ter entrados nos autos do processo em que foram descobertas porque, ao não ter nenhuma relação com o objeto da investigação e carecer totalmente de transcendência penal, deveriam ter sido rechaçadas. Isso não incide de maneira negativa na possibilidade investigativa dos órgãos administrativos respectivos, porque contam com seus meios próprios de averiguação de infrações graves, podendo inclusive servir de ‘notitia criminis’ a publicação nos meios de comunicação dessas conversações”.
Guia, p. 398: STJ, HC 33.553 (Min. Laurita Vaz): “É lícita a prova de crime diverso, obtida por meio de interceptação de ligações telefônicas de terceiro não mencionado na autorização judicial de escuta, desde que relacionada com o fato criminoso objeto da investigação”.
Guia, p. 398: STF, HC 84.388 (Min. Joaquim Barbosa): “O objetivo das investigações era apurar o envolvimento de policiais federais e magistrados em crime contra a Administração. Não se pode falar, portanto, em conhecimento fortuito de fato em tese criminoso, estranho ao objeto das investigações”.
Guia, p. 398: VALENTE, Manuel Monteiro Guedes. Conhecimentos Fortuitos: a busca de um equilíbrio apuleiano. Coimbra: Almedina, 2006, p. 133: “Consideramos que são de valorar os conhecimentos fortuitos obtidos por escuta telefônica lícita que se destinem ao ‘esclarecimento de um dos crimes de catálogo’ do art. 187, do CPP, quer o sujeito desses factos seja o arguido do processo em cuja a vigilância telefónica se opera quer seja um terceiro – desde que tenha participado nas comunicações e conversações – , que se mostrem indispensáveis e necessários a esse esclarecimento e que, face a um juízo de ‘hipotética repetição de intromissão’ – ‘estado de necessidade investigatória’ – , se verifique uma probabilidade qualificada de que em aquele processo autónomo se recorreria à escuta telefónica por se mostrar ‘de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova’ e que os conhecimentos tivessem sido comunicados imediatamente ao juiz que autorizou ou ordenou a diligência processual”.
Guia, p. 398: STF, Inq. 3732 (Min. Cármen Lúcia): “A prova encontrada, fortuitamente, durante a investigação criminal é válida, salvo se comprovado vício ensejador de sua nulidade. Nulidade da interceptação telefônica determinada por autoridade incompetente, nos termos o art. 102, inc. I, al. B, da Constituição da República e do art. 1º da Lei n. 9.296/1996. Ausência de remessa dos autos de investigação para o Supremo Tribunal Federal, depois de apresentados os elementos mínimos caracterizadores da participação, em tese, de Ministro do Tribunal de Contas da União e de membro do Congresso Nacional na prática de ilícito objeto de investigação. Contaminação das provas produzidas, por derivação, por não configuradas as exceções previstas no § 1º e no § 2º do art. 157 do Código de Processo Penal. Denúncia rejeitada, por não estar comprovada, de forma lícita, a existência de justa causa para o exercício da ação penal, caracterizando a hipótese prevista no art. 395, inc. III, daquela lei processual”.
Guia, p. 399: STJ, HC 144.137 (Min. Marco Aurélio Bellizze): “1. A interceptação telefônica vale não apenas para o crime ou indiciado objeto do pedido, mas também para outros crimes ou pessoas, até então não identificados, que vierem a se relacionar com as práticas ilícitas. A autoridade policial ao formular o pedido de representação pela quebra do sigilo telefônico não pode antecipar ou adivinhar tudo o que está por vir. Desse modo, se a escuta foi autorizada judicialmente, ela é lícita e, como tal, captará licitamente toda a conversa. 2. Durante a interceptação das conversas telefônicas, pode a autoridade divisar fatos novos, diversos daqueles que ensejaram o pedido de quebra do sigilo. Esses novos fatos, por sua vez, podem envolver terceiros inicialmente não investigados, mas que guardam relação com o sujeito objeto inicial do monitoramento. Fenômeno da serendipidade. 3. Na espécie, os pressupostos exigidos pela lei foram satisfeitos. Tratava-se de investigação de crimes punidos com reclusão, conexos com crimes contra a fauna, punidos com detenção”.
Guia, p. 399: STJ, HC 191.378 (Min. Sebastião Reis Júnior): “Por isso mesmo, inicio com as seguintes reflexões: Qual o ‘valor mais nobre’: o valor de proteção à intimidade das pessoas ou o da busca da verdade nos processos? Qual o limite da relativização dos direitos fundamentais? Quais ‘os limites’ do direito à prova? O ‘modo de agir’ pode valer mais do que o ‘resultado’? Como devem ser vistas as regras probatórias? De um lado, busca-se a preservação da intimidade, da privacidade e de seus consectários (inviolabilidade de sigilo de dados e das comunicações telefônicas, bancário e fiscal); de outro, temos a segurança da coletividade e o poder-dever do Estado de reprimir práticas delitivas. […] E é exatamente no processo penal, onde avulta a liberdade do indivíduo, que se torna mais nítida a necessidade de se colocarem limites à atividade instrutória. A dicotomia defesa social/direitos de liberdade assume frequentemente conotações dramáticas no juízo penal; e a obrigação de o Estado sacrificar na medida menor possível os direitos de personalidade do acusado transforma-se na pedra de toque de um sistema de liberdades públicas”.
Guia, p. 399: PRADO, Geraldo. […] “Também na busca e apreensão poderá ocorrer encontro fortuito. Na execução de uma ordem judicial para a apreensão de uma arma o executor da medida poderá encontrar um quilo de cocaína ou o cadáver insepulto de vítima de homicídio. Por evidente que haverá de apreender a droga e tomar as devidas providências em relação ao cadáver”.