9.13.3 Contexto de Produção e Contexto de Evocação da Memória

Como Preparar as Perguntas para Audiência Criminal - Por Alexandre Morais da Rosa

Planejar adequadamente o modo como as perguntas serão formuladas à testemunha depende da análise do contexto, das recompensas e da metodologia adotada. Ainda que de conteúdo variado, a seguir, indicam-se algumas variáveis que podem auxiliar no êxito do agir processual. O ajuste contextual será sempre tarefa do agente processual, associado ao objetivo estratégico.

1) Planejar as Perguntas: As dúvidas referentes ao modo de se efetuar as perguntas no ambiente do Processo Penal são reiteradas e não existe uma “regra de ouro”; isto é, ainda que tenhamos algumas balizas e indicadores, o roteiro de perguntas dever levar em considerações os aspectos inerentes ao tipo penal, o contexto do caso penal e os agentes processuais. Por mais que seja desafiadora e complexa a preparação, sem ela, os riscos associados são bem maiores (probabilidade x consequência).

2) Lamentar Não Muda o Passado: De nada adianta, depois da audiência, lamentar-se por não ter feito uma pergunta importante. Operou-se preclusão. É uma das manifestações do Espírito da Escada de Denis Diderot, ou seja, a resposta correta veio depois que se estava descendo a escada do Tribunal — e não no momento necessário. A ação chega atrasada. Quantas vezes o agente pensa: eu deveria ter feito isso quando a testemunha disse x… Daí que se instaura um processo recorrente de reavaliações dos movimentos processuais. É o sintoma da ausência de preparação por meio de árvores de perguntas ou, ainda, da heurística do excesso de confiança (o agente confia demais em si mesmo; bem comum).

3) Distinguir o Sinal do Ruído: O que interessa é a percepção da testemunha em face dos dados de realidade e não, em regra, as suas inferências ou opiniões. A criação de metodologia robusta da noção de Cadeia de Custódia da Memória (Contexto de Aquisição e Contexto de Evocação) tende a melhorar o controle epistêmico da “prova testemunhal”, distinguindo o “sinal” (dado do evento) de “ruído” (inferências ou informações acrescidas).

4) Prova Testemunhal: A testemunha evoca a memória (reinscrita, por definição) de três formas: a) objetivamente (descrição independente dos eventos que percebeu); b) subjetivamente (narrativa explicativa da causa-efeito do evento, a partir de seus conhecimentos, ideias e crenças; estabelece “a sua opinião do evento”; e, c) construtivista (a explicação decorre da negociação entre a percepção da realidade, os conhecimentos, ideias e crenças do agente, além das informações incrementadas por terceiros ou pela tempo de reflexão). Prevalece, em geral, a noção construtivista, em que aos dados de realidade são atribuídas inferências decorrentes do Esquema Mental da fonte humana.

5) Pressupostos: O planejamento de perguntas eficazes pressupõe a verificação antecedente de que a testemunha (fonte humana): a) teve contato, pelos sentidos (visão e audição, em geral), com os dados do evento objeto do Caso Penal; b) percebeu a realidade parcialmente (é impossível, por definição, a apreensão de todos os dados e detalhes do evento); c) determinou a melhor explicação de causa e efeito do conjunto de dados (Inferência pela Melhor Explicação: IME); d) utilizou os critérios e preferências pessoais, decorrentes de sua formação, conhecimentos e qualificação profissional (aderentes ou não com as regras legais, científicas etc.); e) organizou hierarquicamente a importância e peso dos dados de realidade, compondo narrativa muito complexa ou detalhista; f) ajustou as percepções iniciais às informações obtidas posteriormente (agentes públicos, mídia e/ou terceiros).

6) Estatuto da Testemunhaa) agente público; b) vítima; c) informante; d) testemunha; e, e) perito.

7) Função  Estratégicaa) esclarecer; b) confirmar; c) descrever; e, d) negar.

8) Objetivosa) conectar; b) colidir; ou, c) confundir.

9) Depoimento Como se Fosse História em Quadrinhos: Todos nós já lemos histórias em quadrinhos (livro, gibi, prospectos etc.), em que a forma indica a cronologia dos eventos. Por mais básico que possa parecer, a utilização da metáfora dos quadrinhos reduz a sobreposição da sequência dinâmica da percepção do evento. O enquadramento situacional da testemunha (observador da realidade e do evento, desde um lugar fixo, provido de aspectos cognitivos e emocionais), relatada na forma de sequência de quadrinhos, possibilita que se isolem as condições de apreensão da realidade (p.ex. se a testemunha estava de costas, não pode ter “visto”, mas apenas “ouvido”). A forma do questionamento se altera. Antes de se perguntar sobre o que a “testemunha viu”, será preciso identificar o “lugar de onde viu”, as circunstâncias do “contexto em que viu”, para somente então, sem adjetivos, indagar-se: “Considerando que a testemunha estava ‘exatamente’ no local X, fazendo Y, sob as condições Z (estado emocional e foco de atenção no momento do evento), descreva-me, por favor, “como se fosse uma história em quadrinhos”, a sucessão cronológica do que foi percebido (não as suas conclusões).

10) Uso de Realidade Aumentada e Recursos 3D: Memória é mais reconstrução do que reprodução. Nos iludimos de que nossa visão tira fotografias da realidade. Em geral não vemos boa parte do que olhamos, mas como acreditamos que só há o que conseguimos ver, o não visto está fora do havido (como se não existisse). Diferentes pessoas tendem a ver coisas diferentes olhando para a mesma cena. A reconstrução do contexto é importante para o fim de identifica eventuais “erros de continuidade”. A apreensão da realidade depende tanto da capacidade de ver, quanto de fatores contextuais, em geral, difíceis de se isolar e superar. A reconstrução da cena do evento, com recursos tecnológicos (p.ex. em 3, 4, 5 D ou Realidade Aumentada), situando o local em que a testemunha alega ter percebido o evento (campo de visão, distância, perspectiva etc.), associado a características pessoais (altura, limitações visuais etc.) e as versões apresentadas pelas demais fontes de prova, melhora a compreensão e a possibilidade de demonstração, especialmente ao julgador, das inconsistências e incoerências. Auxilia, também, na separação do que foi efetivamente percebido e o que foi incrementado, na linha da Cadeia de Custódia da Memória;

11) Desvelar a Testemunha Oportunista: A tática de encadeamento das perguntas deve ser preparada em árvores/grafos (Planos de Ação), sabendo-se, de antemão, qual o curso de indagações, ‘se a testemunha disser isso, em seguida pergunto isso; caso diga que não sabe, pergunto aquilo’. A emboscada é uma tática bem coordenada que busca proporcionar, pela surpresa/trunfo, a derrota da credibilidade ou da fiabilidade da fonte humana. Será necessária certa dose de dissimulação para se levar o depoente ao ponto em que a ação deverá ser realizada. Pode ser durante o depoimento da testemunha, por exemplo, em que se conduz ao ponto em que deve, necessariamente, contradizer o que foi dito antes. Depois, deve existir uma tática para exploração ostensiva do efeito surpresa, sem que se deva, no caso de testemunha, humilhá-la.

12) Obtida a Vantagem é Hora de Parar: É muito comum, depois de emparedar a testemunha, que o agente queira insistir na demonstração da falsidade do conteúdo, incidindo em erro tático (não é o lugar e a função). Jamais sorria ou cante vitória. A postura não causa boa impressão e pode gerar o efeito inverso. No momento em que a testemunha se atrapalha, fica em silêncio porque não sabe o que dizer, titubeia, é o ponto em que se deve parar: não tenho mais perguntas. Não há prova real que auxilie mais, porque passa a ser ‘esculacho’, postura descortês. O subjogo/round está vencido e ninguém precisa dar a volta olímpica antes de o jogo acabar. Para isso será necessário treinamento, visão global, foco na estratégia e controle emocional, monitorando-se o efeito em face do julgador.

13) Roteiro Sugeridoa) cronológico; b) ponto de vista no evento; c) descrição do primeiro contato; d) primeira explicação; e) novas informações (como e de quem obteve); f) conteúdo do diálogo com terceiros; g) “ajustes” ou “novas explicações”; h) substituição da primeira explicação; i) incremento de dados da vítima e/ou do acusado; j) informações incorporadas antes do depoimento na investigação preliminar; l) informações da mídia; e, m) conversas com amigos, familiares ou terceiros sobre a explicação do evento.

14) Desafio Comunicacional: Sem um roteiro mínimo, devidamente baseado em evidências decorrentes da construção adequada da Teoria do Caso, a tendência é de que o desempenho fique à mercê de fatores não estimados, potencializando os riscos de resultados adversos. A excelente pergunta não realizada no momento oportuno é sintoma de amadorismo. Como adverte, por fim, César Luiz Pasold: “Atribuir-se à comunicação e às relações humanas um papel quase acidental é uma das principais fontes geradoras de ineficiência e ineficácia nas atividades pessoais, profissionais e organizacionais”.

15) Planejamento e Estratégia: Diagnosticar, planejar e monitorar a execução de “planos de ação” metodologicamente validados tende a reduzir as surpresas do percurso processual e a perda de chances processuais que, pelo detalhe, podem mudar os rumos do desfecho. Além disso, evita o lamento posterior decorrente de constatação da própria ineficiência. Esse é um dos desafios do Guia do Processo Penal Estratégico (EMais Editora).

Texto originariamente publicado na CONJUR (aqui), coluna Limite Penal (com alterações)

<bibliografia>

Guia, p. 464: “Essa definição merece críticas: não há por que assumir definição jurídica tão estreita quando o que importa é que seja capaz de auxiliar na determinação da infração penal. Inegável que coisas que podemos pegar são qualificáveis como vestígios, mas não há razão para deixar-se de reconhecer que uma troca de e-mails, uma interceptação telefônica, ou mesmo a memória de alguém também apresentam potencial de reconstruir fatos juridicamente relevantes. Por que objetos mereceriam custódia e a memória não? Por que deve ser combatida a contaminação da cena do crime, mas não a manipulação da memória daqueles que contribuirão à determinação dos fatos”.

Guia, p. 465: MANZANERO, Antonio. […] “Un testimonio es un relato de memoria que un testigo realiza sobre unos hechos previamente presenciados, por esta razón a la psicología del testimonio también se la conoce como Memoria de los Testigos”.

Guia, p. 466: FERNANDA, Lara Teles. […] “São eles: 1) a credibilidade do depoente; 2) a confiabilidade da versão; 3) o filtro de falsas memórias; 4) o modo de coleta dos depoimentos; 5) o modo de realização do reconhecimento de pessoas e (in) existência dos fatores que minimizam sua precisão; 6) a ineficácia da repetição do reconhecimento de pessoas; 7) a excepcionalidade do hearsay statement; 8) a existência de um contraditório efetivo na produção da prova”.

Guia, p. 466: FERNANDA, Lara Teles. […] “Como consequência dessa analise interdisciplinar, conclui-se que as restrições da cognição humana que importam ao processo penal ramificam-se em duas: as limitações da testemunha, que podem consistir em falhas de percepção, armazenamento ou linguagem, – cuja descrição sobre determinado evento terá, irremediavelmente, como barreira a intermediação dos seus sentidos e dos seus aspectos linguísticos – e as limitações dos julgadores, principalmente, no que diz respeito a sua suscetibilidade a vieses cognitivos, que podem macular a decisão judicial de estereótipos, preconceitos implícitos, à revelia da prova constante nos autos. O alerta dirige-se também aos membros do Ministério Público, que devem ter cautela com o viés de confirmação, e abandonar posturas como a de coletar, preferencialmente, informações ramificadoras da culpabilidade de um suspeito, atribuindo maior peso a provas que confirmem essa hipótese, em detrimento de outras evidências fortes em contrário as que rebateriam essa tese de culpa”.

Guia, p. 467: POSNER, Richard A. Cómo deciden los jueces. Trad. Victoria Roca Pérez. Madrid: Marcial Pons Ediciones Jurídicas y Sociales, S.A., 2011, p. 139-140: “Pero el exceso de confianza es el riesgo profesional de todo juez pues no hace falta ser autoritario para sentir satisfacción a partir del hecho de creer que se está en lo cierto; es un rasgo humano generalizado. El exceso de confianza está relacionado, de un lado, con la posesión de preconcepciones, que, especialmente cuando son inconscientes, generan una sensación de que uno está en lo cierto, incluso cuando las pruebas recogidas en la investigación son débiles y, de otro, con una tendencia a interpretar las pruebas como confirmatorias de los a priori [priors] de quien está llevando a cabo la investigación. (…) Estamos predispuestos a tener una confianza extrema en lo fundamentadas y coherentes que son nuestras creencias aun cuando no podamos defenderlas. Parafraseando la crítica que una de sus pérfidas hijas hizo al rey Lear, la mayoría de los jueces apenas han tenido mas que un remoto conocimiento de sí mismos. Es improbable que eso cambie”.

Guia, p. 468: MELO, João Ozorio. Em julgamentos, linguagem corporal pode ser tão decisiva quanto palavras. No artigo que escreveu para o Jornal da ABA, ela conta o que aprendeu em seus 12 anos de promotora, com ativa atuação no Tribunal do Júri. Cada sala de julgamento é um palco. Os jurados, no Tribunal do Júri, observam o tempo todo o desempenho do advogado e do promotor. Ambos são personagens que interpretam um papel, mesmo quando não estão dizendo nada. ‘Essa audiência [o corpo de jurados] observa você desde o momento que tomam seu assento, antes mesmo de você dizer qualquer coisa. Afinal, eles não têm nada para fazer. Não podem checar seus smartphones, não podem conversar com os colegas e nem se levantar do banco. Seu único entretenimento é você’, ela diz. Assim, os jurados vão notar tudo o que as pessoas no ‘palco’ (advogado, promotor, escrivão, réu etc.) fazem e começam a tirar algumas conclusões sobre elas. Geralmente, esses personagens acham que, se mantiverem uma expressão neutra, será o suficiente. Mas é preciso tomar cuidado com isso. A expressão neutra de uma pessoa pode sugerir mau humor, irritação, preocupação etc. Muitas vezes, é preciso um certo treino para se chegar a uma expressão facial apropriada – uma coisa que se pode fazer, por exemplo, diante de um espelho. A expressão apropriada, no caso, é a da personagem digna de confiança, tranquila e amigável. ‘Se os jurados acharem que você é uma pessoa desagradável, terão dificuldades em confiar em você’, diz Allison Leotta. Sorrisos dizem muita coisa. Advogados e promotores bem treinados mantém, deliberadamente, um pequeno sorriso no rosto. Mais uma vez, o espelho será útil para treinamento. Sorrisos podem ter vários graus. Um sorriso mínimo, sutil, que expressa calma, tranquilidade; um sorriso um pouco mais aberto, que expressa aprovação; um sorriso ainda um pouco mais aberto, que expressa uma reação — talvez diante de um episódio negativo; ou um sorriso mais largo, que pode ser uma expressão de satisfação ou de amabilidade.Consultar: http://www.conjur.com.br/2016-dez-09/linguagem-corporal-tao-decisiva-juri-quanto-palavras

Guia, p. 468: DIMITRIUS, Jo-Ellan; MAZZARELLA, Mark. Decifrando Pessoas. Trad. Sonia Augusto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. p. 8: “No tribunal, observo constantemente os jurados, as testemunhas, os advogados, os espectadores, até o juiz, procurando qualquer pista de como estão respondendo ao caso e às pessoas que o apresentam. Ouço cuidadosamente as palavras que são ditas, e o modo como são ditas. Dou atenção à maneira como as pessoas respiram, suspiram, tamborilam os dedos, mexem os pés, ou mudam de posição na cadeira. Quando os jurados entram, sinto qualquer cheiro incomum – perfume forte, odor corporal, cheiro de remédio. Quando aperto a mão de alguém, percebo a sensação deste aperto de mãos. Eu uso todos os meus sentidos, o tempo todo”.

Guia, p. 468: DIMITRIUS, Jo-Ellan; MAZZARELLA, Mark. Decifrando Pessoas. Trad. Sonia Augusto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009, p. 14. “Ninguém gosta de ser atacado ou criticado. Com frequência respondemos reforçando nossas defesas como se fôssemos um forte sitiado. Vemos tudo vermelho e deixamos de ouvir. Perdemos a objetividade, e, junto com ela, a nossa capacidade de julgar”.

Guia, p. 468: WALTON, Douglas N. Lógica Informal. Trad. Ana Lúcia R. Franco e Carlos A. L. Salum. São Paulo: Martins Fontes, 2012, p. 5: “A altercação não é amiga da lógica e, muitas vezes, representa o pior tipo de argumento. Nela, a meta de cada argumentador é atacar ou ‘atingir’ o oponente a qualquer custo, usando quaisquer meios, sejam ele razoáveis e justos ou não. Assim, a altercação é caracterizada pelo falacioso ataque ad hominem (ataque contra a pessoa e não contra o argumento) e por argumentos emocionais que não seriam considerados pertinentes por padrões mais razoáveis. (…) Quando um argumento desce ao nível da altercação, geralmente se encontra em grande dificuldade”.

Guia, p. 469: JUNQUEIRA, Thiago. […] “Nas relações de seguro, o risco se apresenta como uma potencialidade danosa, lícita e aleatória que preexiste à contratação e ameaça um interesse legítimo – ‘relativo a pessoa ou a coisa’ – do segurado. Após a contratação, o segurador passa a assumir as consequências econômicas da materialização do risco que aflige o segurado – já não o risco extracontratual, mas um risco contratualmente delimitado, por exemplo, de forma temporal, causal e espacial. Importa, nesse sentido, que o segurador esteja apto a averiguar a probabilidade de magnitude dessa materialização”.

Guia, p. 469: GUARAGNI, Fábio André; GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Identidade física do juiz no processo penal: percurso recente da questão no Brasil e a especial importância do tema na prova dos crimes econômicos. In: FARIAS, Alexandre Ramalho de. Direito e Processo Penal: entre a prática e a ciência. Curitiba: Luiz Carlos Centro de Estudos Jurídicos, 2013, p. 136: p. 153: “De fato, se a instrução do magistrado se faz mediante as provas, o contato imediato deste com as respectivas fontes se impõe. Da testemunha é capaz de captar a postura, a inflexão, as expressões, para além do conteúdo da fala”.

Guia, p. 469: EKMAN, Paul. A linguagem das emoções: Revolucione sua comunicação e seus relacionamentos reconhecendo as expressões das pessoas ao redor.Trad. Carlos Szlak. São Paulo: Lua de Papel, 2011, p. 79: “Há um conjunto de mudanças psicológicas internas que também produzem sinais, visíveis ou audíveis, do que está acontecendo. Robert Levenson e eu estudamos algumas das mudanças do sistema nervoso autônomo (SNA) que ocorrem durante a emoção, como a transpiração, que, às vezes, podemos ver ou sentir o cheiro; a respiração, que pode ser ouvida; e a atividade cardíaca e a temperatura da pele, que são invisíveis. Nossa descoberta de diversos padrões de atividade do SNA para cada uma das emoções pesquisadas também confirma o que descrevi antes como ações predefinidas. Na raiva e no medo, por exemplo, o batimento cardíaco aumenta, preparando a pessoa para o movimento. Na raiva, o fluxo sanguíneo corre para as mãos, aquecendo-as e preparando-as para dar o golpe ou para lutar de alguma forma contra o objeto de raiva. No medo, o fluxo sanguíneo é conduzido para as pernas, deixando as mãos mais frias e preparando os músculos da perna para a fuga. A transpiração aumenta com o medo e a raiva de acordo com a intensidade. A respiração, por sua vez, torna-se mais intensa com o medo, a raiva e a angústia, e se diferencia do suspiro de quando ficamos aliviados. A ruborização é outro sinal visível”.

Guia, p. 470: RITTER, Ruiz; MORAIS DA ROSA, Alexandre. […]  “O Efeito Halo, portanto, corresponde, grosso modo, a essa tendência humana de se pressupor conhecimentos específicos intangíveis a partir de outros gerais e mais tangíveis” […] Ao se considerar factível, para dizer o mínimo, a hipótese do Efeito Halo, igualmente factível, por exemplo, que na ausência de provas concretas a embasar um juízo afirmativo de responsabilização criminal de determinada pessoa que se “intui” seja autora do fato criminoso, se recorra a seus antecedentes (tangíveis) para se conformar mentalmente essa hipótese; que na ausência de segurança sobre a credibilidade de declarações prestadas em determinado processo, se suponha a veracidade ou não, a partir da postura comportamental do declarante (nervosismo, calma, etc.); que na ausência de compreensão sobre o que constitui um comportamento suspeito para fins de uma abordagem policial, utilize-se como critério (absurdo, mas comum em uma sociedade racista) a cor da pele ou vestes; que na ausência de indícios suficientes acerca da participação de determinada pessoa em um caso investigado, leve-se em consideração sua posição social; entre tantos outros exemplos a denunciar a falibilidade do sistema de justiça criminal. Lembre-se: a correlação é o de menos e o fenômeno é involuntário, inerente à condição humana”.

Guia, p. 470: HASTORF, Albert; SCHNEIDER, David J.; POLEFKA, Judith. Percepção de pessoa. Trad. Dante Moreira Leite. São Paulo: Edgard Blücher/USP, 1973, p. 34: “Formamos uma impressão de outra pessoa, mesmo a partir da rápida observação ou ao ouvir alguém descrever algumas de suas características. Nossas impressões são verbalizadas através de alguns nomes de traços – por exemplo, hostil, amistoso, agressivo, cooperador. Tais impressões são imediatas; não temos consciência de inferências. São significativas e organizadas; estamos cientes de uma pessoa que possui um conjunto coerente de traços. Conhecemos a pessoa na medida em que estamos cientes de seus traços e estamos preparados para predizer outros traços ou tendências de comportamento que ainda não observamos. Embora singular, esse indivíduo tem algumas combinações de qualidades de outros indivíduos que conhecemos”.

Guia, p. 470: HAMANN, Ariane. […] “Pode-se obter informações acerca de uma pessoa de forma direta ou indireta. Na primeira, com o contato, observa-se o comportamento, na segunda, trata-se daquilo que se ouve dizer. A partir dessa primeira impressão, construída por pequenos indícios de comportamento, costuma-se generalizar e fazer afirmações convictas sobre diversos atributos, ainda que sem nenhum fato que as comprove, e chegar a uma conclusão. O que ocorre é o chamado efeito halo, que é a formação de uma conclusão rápida e instintiva sobre a pessoa (seu caráter, sua índole, seus defeitos), a partir da primeira observação. Esta formação consiste num processo organizacional, no qual integra-se toda, geralmente pouca, informação obtida em uma categoria significativa (bom/mau, gostar/não gostar, competente/incompetente). Após essa avaliação inicial, em que o observado já passou a fazer parte de uma categoria conhecida do observador, cria-se uma situação de conforto que permite a este fazer diversas inferências ‘óbvias’ a respeito daquele, ainda que sem nenhuma informação adicional, com a utilização apenas das estruturas cognitivas que já possui (representações de estereótipos, comportamentos, situações sociais) a fim de tornar aquela percepção completa e coerente”.

Guia, p. 471: HAMANN, Ariane. A perpetuação das primeiras impressões por meio das decisões judiciais no processo penal: a primeira impressão é a que fica. Florianópolis: UFSC (Direito – Monografia), 2016, p. 11-12: O processo de formação de impressões é analisado em três abordagens, a gestáltica ou configuracional, a abordagem da integração da informação e a abordagem baseada na memória. De acordo com a primeira, o observador analisa os elementos informacionais como um todo, não separadamente, ainda que para isso precise reinterpretá-los. Por exemplo, se percebe numa pessoa as características, divertido, inteligente e egoísta, conclui que a última não combina com as primeiras, assim, a fim de ter uma definição daquela personalidade como um todo, se positiva ou negativa, reinterpreta ou simplesmente ignora o egoísmo. Já para a segunda, ao contrário, cada elemento informacional é valorado separadamente (entre positivos e negativos) e a impressão é o resultado final deste cálculo, que será também positivo ou negativo Exemplificando, ao conhecer uma pessoa generosa, amigável e invejosa, calcula-se que ela tem duas características positivas e uma negativa, a impressão final será, portanto, positiva. É a terceira abordagem, baseada na memória de pessoas, que será adotada neste trabalho. Segundo essa, a formação de impressão depende da análise das informações, sob a luz dos conhecimentos e informações anteriores (memórias). Nesta abordagem foram propostos diversos modelos explicativos, dentre eles, destacam-se aqueles propostos por Srull e Wyer, Brewer, e Fiske e colaboradores.

Guia, p. 471: VALA, Jorge; MONTEIRO, Maria Benedicta. […] “Dentre os elementos não verbais que influenciam a formação de impressões, salientam-se a cor da pele, a atractividade do rosto e do corpo, a expressão facial, o contacto através do olhar, o modo de andar, a postura corporal, a ocupação do território, o tom de voz, o odor corporal e o contacto táctil. Por exemplo, enquanto a ‘cor da pele’ leva, geralmente, à activação de estereótipos sociais, atribuindo à pessoa uma série de características relativas ao grupo em que é categorizada, já a ‘atractividade física’ desencadeia, habitualmente, uma impressão positiva acerca da pessoa”.

Guia, p. 471: HAMANN, Ariane. […] “A atratividade pela beleza decorre de um estereótipo segundo o qual ‘o belo é bom’. De acordo com esse estereótipo, o traço da beleza física é diretamente conectado a traços positivos de personalidade, isto é, quando se vê uma pessoa ‘bonita’, logo se imagina que ela seja bem sucedida pessoal e profissionalmente, tenha um bom emprego ou capacidade para conseguir um, seja feliz, etc. Assim, em várias situações essas pessoas são beneficiadas pelo simples fato de estrem dentro do padrão de beleza imposto, por exemplo, os alunos mais bonitos recebem mais atenção dos professores, os réus mais complacência dos julgadores e os profissionais mais crédito de seus entrevistadores”.

Guia, p. 472: HAMANN, Ariane. […] “Caso a pessoa-alvo seja realmente interessante ou relevante, segue-se para as demais etapas: atenção (à informação disponível), confirmação da categorização inicial (aqui, após analisar mais atentamente a pessoa-alvo, conclui-se pela consistência ou não da impressão inicial), caso a categorização se confirme, o processo termina, em caso negativo, passa-se a próxima etapa, a recategorização (o nome é autoexplicativo – como a pessoa não se encaixou na categoria anterior, torna-se necessária uma nova, que se encaixe aos atributos particulares daquela). A última etapa apenas ocorre caso as anteriores não tenham sido bem sucedidas, e ainda assim, caso o percepcionador tenha tempo, recursos e motivação para prosseguir na compreensão da pessoa-alvo, trata-se da integração peça a peça (refere-se à análise de cada atributo da pessoa-alvo, integrando-os para chegar a uma conclusão)”.

Guia, p. 472: HAMANN, Ariane. […]“Caso a pessoa-alvo seja realmente interessante ou relevante, segue-se para as demais etapas: atenção (à informação disponível), confirmação da categorização inicial (aqui, após analisar mais atentamente a pessoa-alvo, conclui-se pela consistência ou não da impressão inicial), caso a categorização se confirme, o processo termina, em caso negativo, passa-se a próxima etapa, a recategorização (o nome é autoexplicativo – como a pessoa não se encaixou na categoria anterior, torna-se necessária uma nova, que se encaixe aos atributos particulares daquela). A última etapa apenas ocorre caso as anteriores não tenham sido bem sucedidas, e ainda assim, caso o percepcionador tenha tempo, recursos e motivação para prosseguir na compreensão da pessoa-alvo, trata-se da integração peça a peça (refere-se à análise de cada atributo da pessoa-alvo, integrando-os para chegar a uma conclusão)”.

Guia, p. 472: DIMITRIUS, Jo-Ellan; MAZZARELLA, Mark. Decifrando Pessoas. Trad. Sonia Augusto. Elsevier, 2009, p. 41: “Mentirosos habituais e profissionais, são difíceis de serem percebidos apenas pela linguagem corporal. O mentiroso habitual está tão acostumado a mentir que pode não se importar ou nem se dar totalmente conta de que está mentindo e assim ele normalmente não o demonstra. O mentiroso profissional ensaia suas mentiras tão bem que seu comportamento demonstra pouca coisa”.

Guia, p. 472: TJDF, APC 2012011199933-5 (Des. Mario Machado): “O prejuízo é evidente porque o princípio da identidade física do juiz é uma garantia processual penal, pois permite que a sentença seja proferida pelo magistrado que teve contato imediato com toda a prova, não se limitando à análise apenas das palavras empregadas ou ao teor das respostas, mas também a uma série de outros códigos, tais como a linguagem corporal, a entonação de voz, as pausas, a força do olhar, entre outros, que podem influenciar na convicção do magistrado. Assim, acolho a preliminar para anular a sentença, determinando o retorno dos autos à Vara de origem para que outra seja proferida pelo MM. Juiz que presidiu a instrução”.

Guia, p. 473: LOPES JR, Aury; MORAIS DA ROSA, Alexandre. Com que roupa eu vou, ao júri que você me intimou. “Até que enfim os tribunais começaram a se dar conta de que a primeira impressão gera enorme efeito nas relações humanas e anulou julgamento em que o acusado, na sessão do júri, permaneceu com as roupas de presidiário. O desembargador Josemar Lopes Santos, no julgamento da Apelação 0001188-72.2012.8.10.0060, do TJMA, consignou: ‘A submissão do acusado a julgamento pelo Tribunal do Júri popular utilizando vestes de interno do sistema penitenciário, em contraposição à irresignação da defesa técnica quanto a referido fato, leva à anulação da sentença e do respectivo ato processual, diante da clara violação aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da isonomia, da vedação ao tratamento desumano ou degradante e da vedação a direitos fundamentais, posto que tal ocorrência gerou desnecessária estigmatização prévia do apelante perante o Conselho de Sentença, a denotar clara infração à garantia da paridade de armas no processo penal; III. 1° Apelo prejudicado. 2° Apelo conhecido e provido’””. Consultar: https://www.conjur.com.br/2019-ago-16/limite-penal-roupa-eu-vou-juri-voce-me-intimou

Guia, p. 473: RITTER, Ruiz. Imparcialidade no processo penal: reflexões a partir da teoria da dissonância cognitiva. Porto Alegre: PUCRS (Dissertação: Mestrado), 2016, p. 125-126: “Nada diferente, note-se, do que se viu na teoria, tanto sob o ponto de vista da dissonância cognitiva (dissonância pós-primeira impressão), quanto sob o prisma da percepção social de pessoas, mais especificamente no que se refere ao chamado efeito primazia. Afinal, reitera-se, se após a obtenção de uma cognição inicial (primeira impressão) sobre alguém, a tendência do indivíduo é de preservá-la (efeito primazia), evitando-se o rompimento do seu estado de consonância cognitiva, sempre que esta for questionada, sobrevirão processos involuntários (desvalorização das cognições dissonantes e a adição de novas cognições consonantes à cognição existente, ou, nos termos de Schünemann, efeito perseverança e busca seletiva de informações) e técnicas específicas (percepção errônea, invalidação e esquecimento seletivo), destinados a ratificá-la, exatamente o que apontam os resultados da pesquisa empírica realizada”.

Guia, p. 474: PRADO, Geraldo. Prova Penal e Sistemas de Controles Epistêmicos: a quebra da cadeia de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014, p. 57: “A proibição da surpresa (unfair surprise) pode ser contemplada também no dever da acusação de preservar os elementos informativos obtidos e disponibilizá-lo à defesa, sempre que esta necessitar. O filtro processual contra provas ilícitas depende do rastreio das provas às fontes de prova (elementos informativos) e a ilicitude probatória, direta ou por derivação, é mais facilmente detectável na sequência deste rastro produzido entre as fontes de prova e os elementos (meios) probatórios propriamente ditos (…) A paridade de armas sucumbe na hipótese de a acusação, por si ou através da polícia, vir a dispor de amplo conjunto de informações e este acervo terminar sonegado à defesa, ainda que parcialmente, porque não foi devidamente resguardado ou até porque foi suprimido”.

Guia, p. 474: RAMOS, João Gualberto Garcez. Curso de processo penal norte-americano. São Paulo: RT, 2006, p. 119-120: “a matriz desse princípio se encontra na expressão ‘testemunho direto’, tradução da expressão inglesa correspondente (testimony of two witnesses to the same overt act). Embora o dispositivo constitucional trate apenas do crime de traição [art. 3º, seção 3ª, cláusula 3ª], a vedação dos testemunhos indiretos permeia todo o direito probatório, ao ponto de as Regras Federais de Evidência (Federal Rules of Evidence) – o direito legislado (statutory law) sobre matéria de prova – tratarem amplamente do assunto e arrolarem os casos restritos em que esse princípio pode ser excepcionado. [120] A ideia por trás desse princípio é que a admissão de testemunhos indiretos, ou ‘de ouvir dizer’, viola o necessário equilíbrio do processo, na medida em que impede o exame conveniente da testemunha. De fato, muitas vezes é impossível – ou sumamente difícil – afirmar que alguém, em algum momento, não ouviu algo de outrem. Por tal razão, esse princípio também se extrai do devido processo legal”.

Guia, p. 474: MENDES, Paulo de Sousa. Lições de Direito Processual Penal. Coimbra: Almedina, 2014, p. 175: O regime legal dos meios de prova típicos visa garantir a máxima credibilidade dos mesmos para a demonstração dos factos probandos. Nesse campo, são proibidos, por exemplo, o chamado testemunho de ouvir dizer (art. 129º, nº 1), a reprodução de vozes ou rumores públicos (art. 130º, 1º)”.

Guia, p. 474: GOMES, Décio Alonso: Prova e imediação no processo penal. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 105: “O testemunho de ouvir dizer, enquanto versante sobre fatos narrados por pessoa estranha ao juízo, apresenta um perfil atenuado de relevância probatória, justamente porque indireta, subtraindo da imediação seu maior trunfo: a avaliação da credibilidade do declarante e da veracidade do declarado por meio da interação comunicacional. De igual sorte, compromete o exercício do contraditório, na medida em que impede ou ao menos dificulta significativamente o processo dialético na formação da prova. Algumas ponderações recomendam a exclusão do testemunho indireto do rol de meios de prova legítimos e válidos: a) falta de percepção direta da pessoa quanto ao fato a ser provado; b) falta de impressão precisa quanto ao fato a ser provado; c) falta de capacidade da testemunha em descrever de forma precisa a sua impressão; e, f) falta de sinceridade da testemunha em relação ao fato a ser provado”.

Guia, p. 474-475: LOPES JR, Aury. Testemunho “hearsay” não é prova ilícita, mas deve ser evitada. […] A testemunha de ‘ouvi dizer’ nada presenciou e, portanto, não corresponde aos requisitos de objetividade e retrospectividade, na medida em que não teve a ‘experiência probatória’, não conheceu diretamente do fato objeto da discussão na dimensão de caso penal. A título de curiosidade, no sistema inglês existem três provas passíveis de exclusão (exclusionary rules) e proibição valoratória: a) hearsay: testemunha de ‘ouvi dizer’; b) Bad character: prova sobre o mau caráter. Importante para evitar o direito penal do autor (eis outra proibição de prova que poderíamos adotar, especialmente no tribunal do júri); c) Prova ilegal: concepção tradicional de proibição de valoração probatória da prova ilícita. Enfim, a testemunha de ‘ouvi dizer’ (hearsay) não é propriamente uma prova ilícita, mas deveria ser evitada pelos riscos a ela inerentes e, quando produzida, valorada com bastante cautela ou mesmo não valorada. Existe uma insuperável restrição de cognição, pois não se trata de uma testemunha presencial, daí decorrendo o completo desconhecimento do fato e, portanto, um elevadíssimo risco de indução, deturpação e contaminação, pois ela acaba sendo mera ‘repetidora’ de discurso alheio”. Consultar: http://www.conjur.com.br/2015-out-30/limite-penal-testemunho-hearsay-nao-prova-ilicita-evitada2

Guia, p. 475: FIGUEIREDO DO VALE FILHO, Oswaldo.[…] “Se A, por ouvir dizer, afirma que X matou Y, porque Z a informa, nesta perspectiva não será a prova admissível. Seria admitida apenas no caso em que a atestasse que houve o fato da morte de Y, caso A tente revelar o que soube, por ouvir dizer, que X matou y, então a prova será excluída, o que se quer dizer com isso é que, na verdade, a contribuição da testemunha a será irrisória, pois sequer entrará em vias de informação relevante”.

Guia, p. 475: STERNBERG, Robert J. Psicologia Cognitiva. Trad. Anna Maria Luche. São Paulo: Cengage Learning, 2012, p. 212-213: “Existem problemas potenciais sérios de condenação errônea quando se usa o testemunho ocular como único ou mesmo principal fundamento para condenar pessoas acusadas de crimes. Além disso, o testemunho ocular, muitas vezes, é um determinante poderoso para um júri vir a condenar uma pessoa acusada. O efeito é pronunciado, particularmente, se testemunhas oculares parecem altamente confiantes de seu testemunho. Isto é verdadeiro mesmo se as testemunhas oculares conseguem indicar poucos detalhes perceptivos ou oferecem respostas claramente conflitantes. As pessoas, algumas vezes, até pensam que se lembram das coisas simplesmente porque imaginaram ou pensaram sobre elas. Foi estimado que até 10 mil pessoas por ano podem ser condenadas erroneamente com base em um testemunho ocular equivocado. Portanto, em geral, as pessoas são, consideravelmente, suscetíveis a erros nos testemunhos oculares. Em geral, são propensas a imaginar que viram coisas que não viram”.

Guia, p. 475: STERNBERG, Robert J. Psicologia Cognitiva. Trad. Anna Maria Luche. São Paulo: Cengage Learning, 2012, p. 214: “A identificação e a recordação de testemunhas oculares também são afetadas pelo nível de estresse das testemunhas. À medida que o estresse aumenta, a precisão da recordação e da identificação diminui. Essas constatações colocam mais em dúvida a precisão do testemunho ocular, porque a maior parte dos crimes ocorre em situações altamente estressantes”.

Guia, p. 476: TJDF, ApCrim. 2012-06.100.31.1996 (Desa. Sandra de Santis): “I. A credibilidade da palavra da vítima deve pautar-se no discurso coerente e repetido sobre os fatos, além de estar consonante com os demais testemunhos e provas dos autos. II. Os fatos narrados na denúncia foram praticados, em tese, contra menina de 4 (quatro) anos de idade. O perigo de induzir respostas e gerar falsas memórias é um risco na entrevista de crianças no estágio pré-escolar. Adultos e outras figuras de autoridade podem distorcer as percepções e recordações de infantes ao inquirir com uma pré-concepção do fato ocorrido. III. No caso concreto, o genitor da menor, por vingança e pautado em longo histórico de entreveros com o acusado, incutiu a ideia dos abusos, como retaliação ao réu, fato reconhecido posteriormente. IV. O conjunto probatório não é suficiente para demonstrar a materialidade e a autoria. Mister absolver. V. Apelo provido.”

Guia, p. 476. HAMANN, Ariane. A perpetuação das primeiras impressões por meio das decisões judiciais no processo penal: a primeira impressão é a que fica. Florianópolis: UFSC (Direito – Monografia), 2016, p. 46: “Deste modo, a comprovação do crime tem, geralmente, como provas, apenas as palavras da vítima e do agressor, normalmente contraditórias. Não podendo o juiz se abster de sentenciar, e não contando com outros elementos probatórios, passa a analisar o crime levando em conta o comportamento pessoal dos envolvidos. Assim, a vítima deve ter um comportamento que indique poder ser uma vítima, bem como o réu deve ter um comportamento social que indique que seria capaz de cometer um estupro. Ocorre que, como visto anteriormente, no momento da audiência de instrução criminal o julgador não tem dados ou tempo suficientes para traçar um perfil daquela pessoa (vítima ou réu), recorrendo, por consequência, aos estereótipos e preconceitos. Portanto, deve a mulher preencher o perfil de ‘mulher honesta’, e o homem se encaixar no ‘perfil de estuprador’”.

Guia, p. 476: PEREIRA DE ANDRADE, Vera Regina.[…] “Criminalização sexual que o sistema segue, talvez com mais contundência do que em qualquer outra, a lógica da seletividade, ascendendo seus holofotes sobre as pessoas (autor e vítima) envolvidas, antes que sobre o fato crime cometido, de acordo com estereótipos de violentadores e vítimas”.

Guia, p. 476: MAGNANO, Carla Regina. […] “Ao contrário de proteger a mulher, o campo penal reforça e duplica a vitimização feminina, pois, ao lado das diversas agressões sexuais produzidas por ações masculinas, ela torna-se vítima da violência institucional plurifacetada do sistema; […] tal sistema recria, ainda, os estereótipos inerentes a essas duas formas de desigualdade, particularmente visíveis no campo da moral sexual, na divisão entre mulheres de ‘boa ou má-reputação, ‘honestas’ e ‘desonestas’”.

Guia, p. 476-477: COULOURIS, Daniella Georges. A construção da verdade nos casos de estupro. HAMANN, Ariane. A perpetuação das primeiras impressões por meio das decisões judiciais no processo penal: a primeira impressão é a que fica. Florianópolis: UFSC (Direito – Monografia), 2016, p. 52-53: Resumidamente, uma sociedade em que reina a cultura do estupro é aquela em que a mulher é culpada pela violência sexual que sofre, que acha normal que as mulheres sejam constrangidas em público por cantadas, merecido que uma mulher seja estuprada por estar usando roupas curtas ou por estar bêbada, seja obrigada a fazer sexo com o marido ou companheiro, seja um objeto de propriedade do homem e que serve para satisfazer seus desejos e necessidades. (…) Conclui-se, portanto, que reina na sociedade brasileira uma cultura machista, patriarcal e misógina, solo fértil para reprodução da cultura do estupro. Deste modo, de início, ninguém, nem mesmo os juízes com seus pressupostos de neutralidade, estão imunes às enxurradas de estereótipos e preconceitos que derivam de tais culturas. Conforme afirmado anteriormente, no momento de uma audiência de instrução, tratando-se de um caso (como são muitos) em que a única prova é a palavra da vítima, de todo contraditada pela palavra do réu, o juiz passará, ainda que de forma inconsciente, a tentar decidir qual das duas merece mais crédito para que possa cumprir com sua obrigação de chegar a uma conclusão. Não possuindo grandes informações para tanto, sua decisão será baseada na primeira impressão, naquilo que lhe vem a mente no momento em que olha para cada parte, vítima e réu e, caso não assuma seus próprios preconceitos para que possa racionalizá-los, são eles que tomarão conta e encerrarão os processos psicológicos de formação de impressão e de tomada de decisão. Consultar: http://www.cfemea.org.br/images/stories/pdf/construcaodaverdade_daniellacoulouris.pdf.

Guia, p. 480: STF, HC 73.518 (Min. Celso de Mello): “O valor do depoimento testemunhal de servidores policiais – especialmente quando prestado em juízo, sob a garantia do contraditório – reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-la pelo fato de emanar de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal. O depoimento testemunhal do agente policial somente não terá valor, quando se evidenciar que esse servidor do Estado, por revelar interesse particular na investigação penal, age facciosamente ou quando se demonstrar – tal como ocorre com as demais testemunhas – que as suas declarações não encontram suporte e nem se harmonizam com outros elementos probatórios idôneos”.

Guia, p. 480: FONSECA, Anderson Lobo da. Questionamentos sobre a primazia do depoimento policial na Justiça Criminal: a força da palavra repressiva. É nesse sentido que se percebe a polícia investida de poderes de uma verdadeira ‘fé pública’: segundo pesquisa do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da USP, 74% das prisões por tráfico de drogas em São Paulo contaram apenas com o testemunho dos policiais que realizaram a apreensão do acusado, e, em 76% de todos os inquéritos policiais da cidade, os agentes que participaram da prisão foram ouvidos como testemunhas. O peso desproporcional dado à palavra policial enquanto prova e o descompasso disso com os princípios constitucionais ficam ainda mais evidentes ao analisarmos o que geralmente ocorre nas prisões ligadas às drogas. Alguns desses problemas, segundo essa pesquisa do NEV, transparecem em categorias como ‘confissão informal’ e ‘entrada franqueada’, e no vínculo que se faz entre o acusado e a posse da droga. Verificou-se que, em 44% dos casos analisados, os policiais militares alegaram que o acusado confessou a autoria no momento da prisão, mas, nos depoimentos formais, apenas 11% desses acusados efetivamente confessaram a autoria. O problema está na fase judicial, quando essas ‘confissões informais’, rechaçadas no depoimento formal do acusado, são levadas em consideração pelos juízes como ‘forte indício de culpa’. Consulta: http://diplomatique.org.br/a-forca-da-palavra-repressiva/

Guia, p. 480: NUCCI, Guilherme Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. São Paulo: RT, 2010: “Para a comprovação da prática do crime de tráfico ilícito de entorpecentes (e de outros tipos penais previstos nesta Lei), exigia-se, no passado, prova testemunhal considerada isenta, vale dizer, distinta dos quadros da polícia, pois esta, através dos seus agentes, seria a responsável pela prisão ou investigação, logo, teria interesse em mantê-la, justificando seus atos e pretendendo a condenação do réu. Não mais vige esse pensamento, como majoritário, nos tribunais brasileiros. Preceitua o art. 202 do CPP que ‘toda pessoa poderá ser testemunha’, logo, é indiscutível que os policiais, sejam eles os autores da prisão do réu ou não, podem testemunhar, sob o compromisso de dizer a verdade e sujeitos às penas do crime de falso testemunho. Ressaltamos, entretanto, que é preciso cautela, em determinadas peculiares situações, para a aceitação incondicional desses depoimentos. Parece-nos cauteloso que o magistrado, visualizando, em processos de apuração de crime de tráfico ilícito de entorpecentes, um rol de testemunhas de acusação formado somente por policiais, indague dos mesmos a razão pela qual não se obteve nenhuma outra pessoa, como testemunha, estranha aos quadros da polícia. Essa verificação é essencial, pois uma apreensão de drogas feita à vista de inúmeras pessoas, em local público, por exemplo, pode perfeitamente contar como testemunho de pessoas que não sejam policiais”.

Guia, p. 482: “Desde, pelo menos, a experiência de Stanley Milgram sabe-se que há submissão alienada às determinações de uma autoridade. Com isso, o uso de fardas, jalecos, togas, vestimentas especiais traz consigo o efeito do poder e as demais pessoas tendem a obedecer ordens abusivas ou mesmo a sofrer o impacto das insígnias. Conferir: ZIMBARDO, Philip. O efeito Lúcifer: como as pessoas boas se tornam más“.

Guia, p. 483: MALATESTA, Nicola Framarino dei. A lógica das provas em matéria criminal. Tradução de J. Alves de Sá. Servanda Editora: Campinas, 2013, p. 371: “Na experiência geral da humanidade, a qual mostra como na realidade e no maior número dos casos, o homem é verídico”.

Guia, p. 483: BARROS, Marco Antônio de. A Busca da Verdade no Processo Penal. São Paulo: RT, 2002, p. 198: “A doutrina passou a creditar grande respeito à prova testemunhal, tratando-a como digna de fé por revestir-se da chamada ―presunção de veracidade humana –, até hoje encontrando-se quem lhe empreste valor extraordinário”.

Guia, p. 483: RAMOS, Vitor de Paula. Prova testemunhal: do Subjetivismo ao Objetivismo. Do Isolamento Científico ao Diálogo com a Psicologia e a Epistemologia. São Paulo: RT, 2018, p. 79: “De maneira alguma reduz a importância ou a utilidade do testemunho. Simplesmente exige que, para que esteja epistemicamente justificado, um conhecimento obtido mediante testemunho seja confirmado por razões positivas”.

Guia, p. 483: IGARTUA SALAVERRÍA, Juan. Prolongaciones a partir de Laudan. In: Doxa: Cuadernos de Filosofia del Derecho, nº 28, 2005, p. 148: “Normalmente, la reconstrucción del – hecho (objeto de la causa) está trufada de varias y variadas inferencias que afectan tanto a la fiabilidade que merece cada medio de prueba como al trayecto que conduce desde los medios de prueba al factum probandum. Pues bien, la inferencia que concierne a la fiabilidad atribuída a cada medio de prueba debe insertarse en el conjunto de las inferencias que atañen a la fiabilidad asignada a los otros medios de prueba. Y, a su vez, la inferencia que conduce desde un medio de prueba, declarado atendible, al hecho a probar debe colocarse en una trama con las otras inferencias que ponen en relación los otros medios de prueba, también atendibles, con el hecho de la causa”.

Guia, p. 483: TETAZ, Martín. Psychonomics: como o funcionamento da mente ajuda a definir nosso comportamento consumidor. Trad. Carolina Caires Coelho e Olga Cafalcchio. São Paulo: Planeta, 2018, p. 108: “Esse é um fenômeno que praticamente não tem exceção: testes de laboratório realizados por esses especialistas constataram que 96% das crianças mentem”.

Guia, p. 485: MORAIS DA ROSA, Alexandre; KHALED, Salah. Você é um jurista cansado? “Não estamos mais nas sociedades disciplinarias de Foucault, nem nas sociedades de controle de Deleuze, para nos transformarmos em sujeitos do próprio rendimento, idênticos na aparente liberdade, banhados pelo significante: yes, we can. Enquanto a sociedade disciplinar produzia normais/anormais, loucos e criminosos, a sociedade do cansaço produz poucos vitoriosos e muitos depressivos e fracassados. Todos podemos fazer, sem limites, aumentando a eficiência. A competição e meritocracia mostram os vencedores, deixando de lado o cemitério de perdedores, mais numerosos. Embora o sujeito continue disciplinado pelas Instituições, o poder anula o dever e, quem sabe, por aí se possa entender o fomento da corrupção, tema que voltaremos noutro dia. A pressão por rendimentos, metas, jeitinhos, acordos, na lógica dos resultados, promove uma violência sistêmica causadora de ‘infartos psíquicos’. O excesso de responsabilidade, a demanda incessante por inciativas, no imperativo do rendimento, torna o sujeito seu próprio algoz”. Consultar: https://emporiododireito.com.br/leitura/voce-e-um-jurista-cansado

Guia, p. 487: “É mais do que comum a cena. Durante o julgamento, enquanto os advogados ou mesmo o relator profere seu voto, muitos dos magistrados estão envolvidos em seus celulares. O tema ganhou relevo, segundo reportagem do Jornal La Nación, quando, durante um julgamento de tráfico, em que três acusados foram condenados à pena de 10 anos, os três magistrados de Goicoechea, conforme vídeo apresentado, estavam mais entretidos com as trocas de mensagens do que com o julgamento. O Tribunal de Apelação anulou o julgamento (n. 166-15), em 02 de fevereiro de 2015. O julgado assinala que os magistrados Francini Quesada Salas, Andrés Mora Quirós e Mariela Villalobos Soto estavam manipulando seus celulares quando da oitiva de testemunhas, leitura da acusação, alegações das partes, ou seja, durante o julgamento, cuja atenção era necessária, afinal, ninguém consegue fazer duas coisas ao mesmo tempo. O julgado afirma que houve uma redução temporal da capacidade de percepção ou de observação dos juízes, que não estiveram durante todo o tempo prestando a atenção devida e indispensável para assegurar a decisão correta. Isso porque estavam desconcentrados quando da oitiva das testemunhas e dos acusados o que compromete a credibilidade de suas conclusões. Cabe assinalar que o Tribunal não nega a possibilidade do uso de novas tecnologias, desde que com moderação. No caso, o uso foi demasiado e estava, por sorte, filmado. De fato, o mínimo que se pode exigir dos magistrados, no exercício de suas funções, é que levem a sério o julgamento, inclusive a sustentação oral das partes. Talvez sirva de advertência ao que se percebe em muitos locais” (Notícia vide Empório do Direito).

Guia, p. 490: DIMITRIUS, Jo-Ellan; MAZZARELLA, Mark. Decifrando Pessoas. Trad. Sonia Augusto. Elsevier, 2009, p. 131: “Não é muito difícil perceber esse tipo de comportamento. Muitas vezes, a representação parece perfeita demais e nada espontânea. As pessoas se sentem à vontade quando estão dizendo uma fala preparada antecipadamente. Se você quiser descobrir como elas se comportam quando não têm a oportunidade de se preparar, retire esta vantagem delas. Tire-as de sua zona de conforto e coloque-as em seu campo”.

Guia, p. 490: MARGRAF, Priscila de Oliveira; MARGRAF, Alencar Frederico. Prova Oral: Linguagem Corporal e Falsas Memórias em Interrogatórios e Depoimentos. Curitiba: Juruá, 2018, p. 180-181: “Para a construção de um padrão comportamental é possível realizar diversas perguntas de cunho pessoal. Tais questionamentos geralmente serão respondidos de maneira espontânea e natural, facilitando um delineamento do perfil do narrador. As perguntas mais utilizadas nos tribunais por Jo-Ellan e Mark são: i) Onde você nasceu?; ii) Onde foi criado?; iii) Qual sua atividade profissional?; iv) Qual atividade profissional dos seus pais?; v) O que faz nos tempos livres?; vi) O que gosta de assistir?; vii) Quais os objetivos pessoais para os próximos anos?; viii) Qual era seu sonho profissional quando criança? … Tais perguntas são importantes para que se conheça o narrador e realizar seu insight. Outros sinais importantes a serem analisados durante uma narrativa (por isso é importante o contato prévio, no momento da qualificação da pessoa) são as expressões de raiva, medo e hostilidade. Segundo Jo-Ellan e Mark podem ser constatados os seguintes padrões: i) rosto ou olhos vermelhos; ii) braços ou pernas cruzadas; iii) respiração curta e rápida; iv) repetição de frases; v) mandíbula cerrada ou lábios apertados; vi) tremor ou braços frenéticos; vii) riso falso ou sarcástico; viii) interromper a fala de outrem”.

Guia, p. 491: WALTON, Douglas N. Lógica Informal. Trad. Ana Lúcia R. Franco e Carlos A. L. Salum. São Paulo: Martins Fontes, 2012, p. 78-79: “Quando a pergunta é muito agressiva, a resposta também tem que conter certa agressividade, embora em níveis razoáveis. A resposta tem que devolver a bola para o autor da pergunta e transferir-lhe o ônus da prova, fazendo com que justifique os pressupostos de sua pergunta”.

Guia, p. 492: MATIDA, Janaina; MORAIS DA ROSA, Alexandre. […] “A pesquisa de Marcelo Semer também serve a denunciar o caminho aberto que a heurística da satisfatoriedade encontra entre nossos julgadores. A palavra do policial eleva-se ao máximo objeto de satisfatoriedade nos processos de tráfico de drogas. Em 800 sentenças, colhidas em 8 estados diferentes, 315 municípios, proferidas por 665 juízes ao longo do período compreendido entre 2013 e 2015, é impossível fechar os olhos para o valor conferido à palavra do policial. O juiz brasileiro entende que a palavra do policial deve prevalecer “à luz da dignidade e da importância da função que exercem”, por serem “possuidores de boa-fé”, porque são “pessoas sérias e idôneas”, porque têm “especial credibilidade”. O policial sempre fala a verdade, enquanto o réu sempre mente. Incoerências no relato do policial são tidas como “pequenas discrepâncias”; presentes nos depoimentos do acusado são sinais indubitáveis de “notáveis divergências”. A presunção de veracidade de tudo o quanto é afirmado pelo policial destoa, de modo manifesto, a mínimas exigências de racionalidade na valoração das provas. Com isso, não estamos aqui afirmando que o policial sempre mente (o que seria equivalente a tentar justificar uma presunção de mentira), mas estamos sim, colocando em destaque a distinção que nunca deve se perder de vista entre a alegação de um fato e o fato mesmo. O que é afirmado por alguém deve ser corroborado por elementos probatórios diversos e independentes. Ainda mais em tempos de tantos avanços tecnológicos capazes de determinar com mais acurácia os fatos que ao direito parecem relevantes”.