<bibliografia>
Guia, p. 229: STF, Rext. 140.370 (Min. Sepúlveda Pertence): “Há um defeito de fundamentação de sentença que se pode reputar equivalente ao de sua inexistência: é a falta de coerência lógica entre a motivação e o dispositivo”.
Guia, p. 229: SERBENA, Cesar Antonio. Normas jurídicas, inferência e derrotabilidade. In: SERBENA, Cesar Antonio (coord). Teoria da Derrotabilidade: pressupostos teóricos e aplicações. Curitiba: Juruá, 2012, p. 32: “Os termos ‘raciocínio não monotônico’ designam uma espécie de raciocínio baseado na ‘inferência derrotável’ (defeasible inference), ou seja, um raciocínio cotidiano em que o agente se reserva o direito de mudar suas conclusões quando obtém alguma nova premissa ou informação, de modo que algumas razões são ‘derrotadas’ por outras quando comparadas. O que leva uma razão a ser derrotada depende do critério utilizado pelo agente, que pode variar em cada situação particular, como o grau de certeza ou incerteza da informação obtida, ou a própria fonte de onde esta informação é obtida. Dessa maneira o agente obtém uma conclusão por tentativas”.
Guia, p. 230: STERNBERG, Robert J. Psicologia Cognitiva. Trad. Anna Maria Luche. São Paulo: Cengage Learning, 2012, p. 448. Por exemplo: Se você é uma mãe, então tem uma criança. 1: Você é mãe: portanto, você tem uma criança; 2 Você não tem uma criança. Portanto, você não é uma mãe. 3. Você não é uma mãe. Portanto você não tem uma criança. 4. Você tem uma criança. Portanto, você é uma mãe.
Guia, 232: CHALMERS, Alan. O que é ciência, afinal? […] O princípio da indução consiste em: “Se um grande número de As foi observado sob uma ampla variedade de condições, e se todos esses As observados possuíam sem exceção a propriedade B, então todos os As têm a propriedade B.”
Guia, 232: CHALMERS, Alan. O que é ciência, afinal? […] “Um exemplo mais interessante embora um tanto medonho é uma elaboração da história que Bertrand Russel conta do peru indutivista. Esse peru descobrira que, em sua primeira manhã na fazenda de perus, ele fora alimentado às 9 da manhã. Contudo, sendo um bom indutivista, ele não tirou conclusões apressadas. Esperou até recolher um grande número de observações do fato de quer era alimentado às 9 da manhã, e fez essas observações sob uma ampla variedade de circunstâncias, às quartas e quintas-feiras, em dias quentes e dias frios, em dias chuvosos e dias secos. A cada dia acrescentava uma outra proposição de observação à sua lista. Finalmente, sua consciência indutivista ficou satisfeita e ele levou a cabo uma inferência indutiva para concluir: ‘Eu sou alimentado sempre às 9 da manhã’. Mas, ai de mim, essa conclusão demonstrou ser falsa, de modo inequívoco, quando, na véspera do Natal, ao invés de ser alimentado, ele foi degolado. Uma inferência indutiva com premissas verdadeiras levara a uma conclusão falsa”.
Guia, p. 233: KUHN, Thomas. […] “Um paradigma é aquilo que os membros de uma comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em homens que partilham um paradigma. […] Os paradigmas são algo compartilhado pelos membros de tais comunidades”.
Guia, p. 233: POPPER, Karl. […] “Todo teste genuíno de uma teoria é uma tentativa de refutá-la. A possibilidade de testar uma teoria implica igual possibilidade de demonstrar que é falsa.”
Guia, p. 233: CARDOZO, Benjamin. N. A natureza do processo judicial. Trad. Silvana Vieira. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 1-3: “O trabalho de decidir causas se faz diariamente em centenas de tribunais de todo o planeta. Seria de imaginar que qualquer juiz descrevesse com facilidade procedimentos que já aplicou mais de milhares de vezes. Nada poderia ser mais longe da verdade. O que é que faço quando decido uma causa? A que fontes de informação recorro em busca de orientação? Até que ponto permito que contribuam para o resultado? Até que ponto devem contribuir? (…) Com frequência, é graças a essas forças subconscientes que os juízes mantêm a coerência consigo mesmos e a incoerência entre si. Numa notável passagem de suas preleções sobre o pragmatismo, William James nos lembra que cada um de nós mesmo os que desconhecem ou execram os nomes e as ideias da filosofia, tem, na verdade, uma filosofia de vida subjacente. Há, em cada um de nós, uma corrente de tendências – que dá coerência e direção ao pensamento e à ação. Os juízes, como todos os mortais, não podem escapar a essa corrente. Ao longo de suas vidas, são levados por forças que não conseguem reconhecer nem identificar – instintos herdados, crenças tradicionais, convicções adquiridas; o resultado é uma perspectiva de vida, uma concepção das necessidades sociais, um sentido. (…) Nessa configuração mental, cada problema encontra seu contexto. Podemos tentar ver as coisas com o máximo de objetividade. Mesmo assim, jamais poderemos vê-las com outros olhos que não os nossos”.
Guia, p. 234: STRUCHINER, Noel. […] “É a justificação da regra que determina quais são as propriedades do caso particular que devem ser levadas em conta no momento da construção do predicado factual, indicando a direção e o grau de generalidade do mesmo. Uma infinidade de generalizações pode ser logicamente estipulada a partir de um caso particular. Porém, as possíveis abstrações operadas em relação às propriedades de um caso particular, podem ser razoavelmente restringidas se temos em mente os objetivos (justificação) da regra. A diferença entre a generalização descritiva e a generalização prescritiva se dá em função de a última ser lapidada de acordo com uma justificação que representa uma meta que se pretende alcançar ou danos que devem ser evitados. A quantidade de generalizações logicamente e empiricamente possíveis a partir de um caso concreto é sempre muito maior do que a quantidade de generalizações prescritivas, que estão norteadas pela justificação. A justificação determina qual, entre várias generalizações de um evento particular, será selecionada como predicado factual da regra que está sendo construída”.
Guia, p. 234: Apliquei a proposta de Schauer no julgamento do HC 5006523-23.2020.8.24.0090, em que fui relator na 3ª Turma Recursal, do TJSC, sobre o uso de Canabidiol: “Assim é que: (i) está comprovado que o paciente é portador de Mal de Parkinson; (ii) que os tratamentos anteriormente ministrados não surtiram efeitos; (iii) o quadro de saúde se agravou; (iv) o uso de canabidiol apresentou melhoras em seu quadro de saúde; (v) há recomendação médica, com evidências científicas comprovadas; (vi) o custo de importação do medicamento é inviável; (vii) há possibilidade de produção artesanal e para uso terapêutico; (viii) que o paciente é credor da efetivação da dignidade da pessoa humana em face do direito fundamental à saúde; e, (ix) que há proibição genérica prevista no art. 28 da Lei 11.343/06 e o paciente pretende autorização para conseguir ter uma vida melhor, sem o receio de ser responsabilizado penalmente. […] Então, para o devido enquadramento da questão, deve-se levar em conta que a generalidade do art. 28, da Lei 11.343/06 (sem prejuízo da própria justificativa), não pode abranger as situações em que há recomendação médica para o uso respectivo na garantia da saúde e não uso recreativo ou de consumo pessoal de maconha. Na hipótese de uso de canabidiol para fins terapêuticos, assim, os fatos operativos não geram a consequência da justificação, podendo se concluir como regra sobreinclusiva. Em resumo, não incide a proibição para fins terapêuticos”.
Guia, p. 235: STRUCHINER, Noel. Para Falar de Regras. O Positivismo Conceitual como Cenário para uma Investigação Filosófica acerca dos Casos Difíceis do Direito. Rio de Janeiro: PUC-RIO (Doutorado – Direito), 2005, p. 153: “Uma regra é sobreinclusiva quando seus fatos operativos englobam casos particulares que não geram a consequência que representa a justificação da regra.” […] enquanto as subinclusivas “deixam de tratar de certos casos que acarretam a consequência que representa a justificação da regra”.
Guia, p. 235: CELLA, José Renato Gazieiro; SERBENA, Cesar Antonio. Prefácio. In: VASCONCELLOS, Fernando Andreoni. Hermenêutica jurídica e derrotabilidade. Curitiba: Juruá, 2010, p. 8: “A lógica clássica e a lógica silogística são monotônicas no sentido que, de um conjunto de premissas, podemos deduzir um conjunto de conclusões; porém, quando adicionamos novas premissas ao conjunto inicial de premissas, as mesmas conclusões já deduzidas continuam valendo. Uma lógica não-monotônica é uma lógica diferente da lógica clássica e da lógica silogística, uma vez que nela, de um conjunto inicial de premissas, deduzimos certa conclusão, mas, uma vez adicionada uma outra premissa ao mesmo conjunto inicial, as conclusões não continuam valendo necessariamente. Dependendo da premissa adicionada, ela pode ‘derrotar’ a conclusão original e proporcionar uma nova conclusão. […] Percebe-se que o raciocínio jurídico é um típico exemplo de utilização da inferência não monotônica ou do raciocínio derrotável: basta pensar que o magistrado, ao partir de um conjunto inicial de fatos provados, pode mudar radicalmente sua convicção inicial frente a uma nova prova produzida ao final do processo e sentenciar de uma forma contrária à decisão inicialmente formulada mentalmente. Da lógica deôntica não monotônica ou derrotável, a derrotabilidade migrou rapidamente para a Teoria do Direito”.
Guia, p. 236: VASCONCELLOS, Fernando Andreoni. Hermenêutica jurídica e derrotabilidade. Curitiba: Juruá, 2010, p. 57. É possível: “afirmar a existência de um núcleo comum atribuído ao seu conceito, consistente na ideia segundo a qual a consequência da norma jurídica pode ser derrotada, afastada, não-aplicada, em razão da existência de um fato, interpretação ou circunstância com ela incompatível. Em termos processuais, pode-se falar em fatos impeditivos, modificativos ou extintivos capazes de infirmar a norma ‘prima facie’, derrotando-a a fim de permitir a aplicação de uma norma excepcional, diferente daquela prevista a priori a partir da literalidade textual”.
Guia, p. 236: SERBENA, Cesar Antonio. Normas jurídicas, inferência e derrotabilidade. In: SERBENA, Cesar Antonio (coord). Teoria da Derrotabilidade: pressupostos teóricos e aplicações. Curitiba: Juruá, 2012, p. 16 – p. 28: “A derrotabilidade, enquanto propriedade formal de certas regras de inferência, poderia cumprir o importante papel de servir como modelo para o raciocínio jurídico a partir dos princípios constitucionais […] Tais princípios, na maioria dos casos, são fórmulas tão gerais que, partindo de um mesmo princípio, podemos chegar a conclusões contraditórias. Creio que basta citar o conhecido princípio da dignidade da pessoa humana”.
Guia, p. 236: VASCONCELLOS, Fernando Andreoni. Hermenêutica jurídica e derrotabilidade. Curitiba: Juruá, 2010, p. 25: “Torna-se possível falar em derrotabilidade da norma jurídica e do fracasso da solução prima facie, exatamente no momento em que o texto deixa de ser simples texto e passa a servir de matéria-prima para a produção normativa do intérprete”.
Guia, p. 236: SANTOS, José Eduardo Lourenço dos. Direito penal, derrotabilidade e princípio da insignificância. In: SERBENA, Cesar Antonio (coord). Teoria da Derrotabilidade: pressupostos teóricos e aplicações. Curitiba: Juruá, 2012, p. 438: “Ao se verificar o princípio da insignificância, e o que ele compreende, podemos afirmar que sempre que determinado comportamento se adequar a um modelo penal, no caso, a uma norma penal incriminadora (aquela que define crimes e impõe sanções penais), ocorrendo uma ínfima ofensa ao bem jurídico, aí compreendida sua natureza e extensão da ofensa, pela atuação do princípio da bagatela, tal norma penal é derrotada, em virtude do que deixa de ser aplicada naquele caso concreto. Vale lembrar que isso não significa a revogação dessa lei penal, mas sim sua não aplicação a determinado caso”.
Guia, p. 236: BISSOLI FILHO, Francisco. A aplicação da noção de derrotabilidade ao direito penal na preservação dos direitos humanos. In: SERBENA, Cesar Antonio (coord). Teoria da Derrotabilidade: pressupostos teóricos e aplicações. Curitiba: Juruá, 2012, p. 424: “O que importa sublinhar, para que fique clara a aplicação da noção de derrotabilidade no âmbito do direito penal, é que, por serem os tipos penais incriminadores, condições insuficientes para determinarem as consequências penais, como qualquer outra norma jurídica, acabam sendo derrotados por condições ou exceções implícitas, que, no direito penal, são chamadas de causa supralegais de exclusão de tipicidade, ilicitude, culpabilidade ou punibilidade”.
Guia, p. 236: VASCONCELLOS, Fernando Andreoni. Hermenêutica jurídica e derrotabilidade. Curitiba: Juruá, 2010, p. 9: “Alguns criticam a derrotabilidade afirmando que ela traz insegurança jurídica. A crítica é infundada, pois, geralmente, quem a formula não é consciente de que, ao raciocinar, a utiliza na maioria dos casos condicionais derrotáveis, porém não admite expressamente essa realidade, ou por artifício retórico ou por falta de rigor científico, ou mesmo por desconhecimento”.
Guia, p. 237: VASCONCELLOS, Fernando Andreoni. Hermenêutica jurídica e derrotabilidade. Curitiba: Juruá, 2010, p. 16: “A derrotabilidade, portanto, encontra-se em uma perspectiva pragmática do direito e em seu estudo são enfrentadas questões como: as previsões do direito positivo, muitas vezes dotadas de ambiguidades e vaguezas, permitem antever, com a marca de definitividade, o conteúdo da norma jurídica aplicável? Até que ponto o fenômeno da constitucionalização de direitos afeta a cognição de dispositivos infraconstitucionais? A interpretação sistemática gera a indeterminação completa do direito positivo? O direito que fundamenta uma pretensão judicial é derrotado em razão do acolhimento de uma exceção oposta pela outra parte? É possível falar em incidência automática e infalível de uma previsão textual imiscuída de interferências fáticas ou jurídicas?”.
Guia, p. 237: VASCONCELLOS, Fernando Andreoni. Hermenêutica jurídica e derrotabilidade. Curitiba: Juruá, 2010, p. 67: “O raciocínio não monotônico (ou por defeito) permite o tratamento de contextos normativos dotados de informações incompletas. Nele torna-se viável a extração de conteúdos normativos prima facie a partir de interpretações de disposições do direito positivo, mesmo sendo factível a existência de exceções (explícitas ou implícitas) que possam alterar o sentido e alcance da norma”.
Guia, p. 237: HERDY, Rachel; MATIDA, Janaina. […] “A relação entre ciência e decisão judicial, o que se deve exigir da parte dos nossos juízes no atual cenário é que enfrentem de forma responsável o argumento técnico oferecido pelos especialistas. Juízes não podem decidir quem deve ser preso, mantido em prisão ou solto com base em achismos, preconceitos e desinformações sobretudo quando se está em jogo a vida das pessoas. À semelhança da deferência que esperamos da população em geral, quando o assunto é direito, também devemos exigir dos juízes uma postura deferencial quando o assunto escapa de suas capacidades epistêmicas. É claro que deferir à ciência não se confunde com deferir a qualquer coisa é preciso sempre ter cuidado com as muitas formas de pseudociência”.
Guia, p. 237: BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das pena. Trad. […] “O juiz deve fazer um silogismo perfeito. A premissa maior deve ser a lei geral; a menor, a ação conforme ou não a lei; a consequência, a liberdade ou a pena. Se o juiz for constrangido a fazer um raciocínio a mais, ou se o fizer por conta própria, tudo se torna incerto e obscuro”.
Guia, p. 237: SGARBI, Adrian. Curso de Teoria do Direito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2020, p. 313: “O modelo de Beccaria não atenta para a importância da construção mesma das premissas, como também não dá conta das cadeias de raciocínios que se distinguem e que não seguem o silogismo. Porque a premissa normativa não está já pronta apenas por ter sido ‘criada pelo legislador’, e tampouco a questão de fato já é evidente apenas ‘dizendo-se o que ocorreu’. A norma que é individualizada pelo juiz decorre de trabalho de justificação, como a análise do fato afirmado consiste em atividade de se argumentar fornecendo razões que atestem a plausibilidade do que se afirma e a sua adequada qualificação jurídica”.
Guia, p. 240: VASCONCELLOS, Fernando Andreoni. Hermenêutica jurídica e derrotabilidade. Curitiba: Juruá, 2010, p. 41: “A dúvida reside na averiguação de quando essa leitura constitucional de determinada previsão é legal e cabível e quando ela é oportunista, criada apenas para distorcer o sentido de uma previsão constitucional”.
Guia, p. 240: STEIN, Ernildo. […] “Vamos entender que o direito não é simplesmente um processo em que o juiz subsume um caso particular numa espécie de princípio universal. Vamos começar a perceber que este princípio, do qual tanto se faz uso no direito – da subsunção –, é um caso concreto, […] faz parte de um mundo comum, de onde a lei emerge e de onde o juiz, de certo modo, retira os critérios últimos para aplicar a lei a um caso. Quer dizer, começamos a perceber em todos os campos das ciências humanas esta questão do mundo vivido.”